terça-feira, 16 de outubro de 2012


No obscuro dos desejos



Scraps
Verônica sentia as faces quentes, enrubescidas, traía frêmitos involuntários, suspiros mal disfarçados, arrepiava-se. Os seios intumescidos despontavam na camiseta, os olhos traziam as pupilas dilatadas. Como conviver com aquelas sensações, cada vez mais atrevidas e freqüentes? Tentava disfarçar para si mesma, mas já não estava se contendo na situação.
Nem precisava vê-lo para sentir-se afogueada, intranqüila e lânguida. Para tanto bastava lembrar –se de sua figura, do cheiro de seu perfume, ou ouvir a sua voz máscula, segura, a chamando pelo interfone.
Pensou em demitir-se, arrumar uma desculpa qualquer e buscar outro serviço, o que precisava, com urgência, era manter-se longe da sua presença, sob pena de não conseguir mais se controlar. Era um homem mais velho que ela, a razão de sua incontrolável insegurança e desejo. Temia confessar a alguém o que sentia, poderia parecer um ato condenável de uma jovem sedenta de uma experiência íntima, ousada.
Naqueles momentos de suplícios pessoais, sonhava em tê-lo de forma mais impudica e sacana, desconhecendo a si mesma, até então reservada e tímida. Numa metáfora, via-se como um vulcão prestes à erupção, à deriva da razão e dos bons costumes, a verter lavas incandescentes e devastadoras. Surpreendia-se no banheiro apalpando-se lascivamente, tendo-o no imagináriocomo companhia. Circunstância em que obtinha relativa paz, lavando o rosto, retocando a maquiagem leve, retornando a seuposto, a escrivaninha de secretária.

 A ela cabia ordenar as tarefas ao jovem mensageiro, adolescente com a face marcada por acnes, coisas próprias da puberdade. E este, a levava para o seu paraíso profano e inconfessável, a desejava com tanta gana e luxúria que se envergonhava de seus próprios pensamentos. Bem que no almoxarifado, às escondidas, poderia ser um ambiente apropriado, ah, se ela pudesse imaginar... A seguia com o olhar, observando cada gesto, salivando na malemolência de seu gingado naqueles saltos altos que só denunciavam as ancas bem delineadas, as pernas roliças e torneadas naquele vestido colado. Que tara tinha por ela, razão de suas freqüentes ausências, pretextando usar o sanitário. Ela era sua rainha e ele sempre seu súdito apaixonado, vivia um rompante sufocado nas labaredas de seu íntimo em convulsão, tinha que estar atento no que ela lhe dizia para não se trair se denunciando.  Enrolava a língua ao pronunciar seu nome, dona Verônica. Ficava em seu lugar, numa minúscula mesa, espremido, esperando pelas ordens de sua rainha. Ficava a espreitá-la, cada vez que se levantava de sua cadeira e desfilava pela sala, indo e vindo. A imaginava desnuda, como deveria ser exuberante, a silhueta apertada nas vestes não deixavam dúvidas, a pele morena clara, o sorriso perfeito, cílios arqueados e provocantes, o seios então...
Ela buscava entreter-se naqueles papéis, digitando compassadamente no computador, mas a mente, não raro, voltava-se para o patrão. Seu aroma no ar a embevecia, esforçava-se para identificar o nome da colônia preferida por ele. Pensou em adquirir um frasco para aspirá-lo em sua ausência.
Ao levantar a cabeça, desatenta, cruzou os olhares com o jovem que a assessorava, sentiu que ele queria lhe dizer algo, e que não conseguia. Instantes de hesitação. Teria esquecido de lhe transmitir alguma coisa, por que estava plantado em sua frente a olhando daquela forma, embaraçado e confuso ?
O chamado pelo interfone a tirou do impasse, voltando-se para resolver à voz que a chamava.
Dona Verônica... ( voz sôfrega, angustiada, indecisa do mancebo tímido, ainda bem que ela não percebera a mancha aparente em sua calça,na altura das genitálias) 
Levantando-se para atender o chamado, parecendo não ouvi-lo.



Assim transcorriam os dias, cada qual imerso em seus desejos inconfessáveis.
Fim de expediente. O rapazote desejando a colega e esta inebriada pelo chefe.
Em uma esquina, um carro pára, o magnético desce o vidro e uma mulher loura, de saltos altos, roupa colada e luminescente, seios fartos e batom vermelho carmim, obedece ao chamado pelo olhar, sai da calçada, cabeça imersa dentro do veículo, sussurrando alguma coisa, como combinando detalhes... 
A andrógina figura em sorriso debochada e matreira entra no carro e partem...
O desejado homem pela jovem moça, vai em aventuras com sua passageira ou passageiro, enquanto o pobre rapaz sonha com a iludida colega...

  publicado no BLOG DO LIMA COELHO - Crônicas, Contos, Poesias e Artigos Literários - São Luiz- MA (+ de seis milhões de acessos na internet. Ilustrações: MEL ALECRIM, poetisa e contista. 

15 comentários:

Anônimo disse...

Meu jovem se tantos desejos contidos fossem gritados, já imaginastes o que seria de nossos ouvidos!

Muito bom!

ubirajara
caravanapoeta@gmail.com
09/10/2012

(SITE DE POESIAS)

Anônimo disse...

É nessa rede sutil, no obscuro dos desejos,
que os corações querem se prender.
Ainda que no final sejam grandemente surpreendidos.
Senti saudades de te ler, Ediloy.
Bj

Gloria Salles
sallesgloria@yahoo.com.br
09/10/2012

(SITE DE POESIAS)

Anônimo disse...

Caro poeta mais um conto onde as nuances da vida se apresentam de forma cristalina, nua e crua em todos os sentidos. Os desejos mais profundos descritos na mais pura das realidades. Meus sinceros aplausos.

J.A.Botacini.

Zezinho.
Jose Aparecido Botacini
ze-botacini@hotmail.com
08/10/2012

(SITE DE POESIAS)

Anônimo disse...

Ediloy como sempre um conto muito intressante, que a gente nunca sabe como vai acabar. Cheio de climax e ante climax. A história podia até se desenvolver de outra maneira, da seguinte forma: O boy aranjava uma namorada, que acabava se apaixonando pela secretária. O chefe briga com o traveco e se apaixona pelo boy. Como já era perto do Natal, o chefe dá uma festinha de fim de ano e aí todo mundo fica com todo mundo, trocando de parceiro. É claro que o nome teria de mudar pra "Éramos quatro", mais aí seria outra história patrocinada pela cerveja Devassa. Mas valeu Ediloy, muito legal seu conto. Bravo!!!!!!!!!!!!!

Fred DeMenezes
fredbut@oi.com.br
08/10/2012

(SITE DE POESIAS)

Anônimo disse...

Sensualidade plena
numa escrita sem rodeios
que fala de sonho e seios
contando de forma amena
essa história serena...
Pobres jovens em lampejos
abrasando-se em ensejos
sem desconfiar de nada,
pois a vida é uma piada
no obscuro dos desejos.

Ronaldo Rhusso

RONALDO RHUSSO
ronaldo.rhusso@gmail.com
08/10/2012

(SITE DE POESIAS)

Anônimo disse...

12/10/2012 14:12 - Miguel Carlos Comp

Belo e bem construido seu conto, parabéns sempre!

(RECANTO DAS LETRAS)

Anônimo disse...

Muito legal, adorei

Comentário Enviado Por: Zilá Em: 15/10/2012


(BLOG DO LIMA COELHO)

Anônimo disse...

Putz! Muito legal.

Comentário Enviado Por: Rosa Amélia Em: 15/10/2012

(BLOG DO LIMA COELHO)

Anônimo disse...

Um arraso de narrativa.

Comentário Enviado Por: Carla Porto Em: 15/10/2012

(BLOG DO LIMA COELHO)

Anônimo disse...

Ferraro está extrapolando na beleza dos seus escritos. Dá uma inveja...

Comentário Enviado Por: william porto Em: 16/10/2012

(BLOG DO LIMA COELHO)

Anônimo disse...

Demaaaaaaaaaaais!!!

Comentário Enviado Por: Larissa Dias Em: 16/10/2012

(BLOG DO LIMA COELHO)

Anônimo disse...

Arre, que nervoso! Quanta ansiedade e amores não correspondidos. Em qualquer dos teus contos, o uso de adjetivos me encanta. Abração

Comentário Enviado Por: Ivette Gomes Moreira Em: 16/10/2012

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Anônimo disse...


Faço minhas as palavras da Ivette

Comentário Enviado Por: Hilda Canário Em: 16/10/2012

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Anônimo disse...

Ediloy, arrasou meu!

Comentário Enviado Por: Martha Vilarinhos Em: 16/10/2012

(BLOG DO LIMA COELHO)

Anônimo disse...

beleza de conto cheio de amarras ehehheeh

Comentário Enviado Por: Lelena Em: 17/10/2012

(BLOG DO LIMA COELHO)