doença de baixa estima
tatuada, carimbada,
na identidade nativa
terra de proscritos
aventureiros fugitivos
indios e negros escravizados
nossos antepassados
vulneráveis passados
toscos empobrecidos
na Terra do Cruzeiro
aportaram seus sonhos
Nação mestiça desenhada
vestígios hereditários
impregnados nas índoles
de um povo submisso
detentores de riquezas
maravilhas cobiçadas
ufanismo em escarnios
pobre Brasil rico,
intenso, varonil,
com seus filhos servis...
MORTA SEREI ÀRVORE SEREI TRONCO SEREI FRONDE. NÃO MORRE AQUELE QUE DEIXOU NA TERRA A MELODIA DE SEU CÃNTICO NA MÚSICA DE SEUS VERSOS. Cora Coralina, poetisa (1869-1985)
quarta-feira, 28 de julho de 2010
PACATO CIDADÃO
temor destes conflitos,
surdos mudos,
intramuros em mim mesmo
figura pacata, cordial,
assassino potencial,
em série assombrosa
mantendo oculto
estigmas e barbáries
só vistas em filmes
lobo voraz
pele de cordeiro
maremotos íntimos
ah, que besta abrigo
em mim para sentir
o sangue das vítimas !
emoções fortes
privilégios da ficção
insosso pacato cidadão...
surdos mudos,
intramuros em mim mesmo
figura pacata, cordial,
assassino potencial,
em série assombrosa
mantendo oculto
estigmas e barbáries
só vistas em filmes
lobo voraz
pele de cordeiro
maremotos íntimos
ah, que besta abrigo
em mim para sentir
o sangue das vítimas !
emoções fortes
privilégios da ficção
insosso pacato cidadão...
segunda-feira, 26 de julho de 2010
ÍNTIMAS INCURSÕES
de tal forma
escarafunchei o baú
a cada investida,
trazia à tona trechos,
retalhos, fragmentos
momentos do ontem antigo
de tal sorte
a formar um mosaico
desconexo, desconforme,
incongruente, de antanhos fugidios
como peças que não se encaixam
em contraste com a pressa
de quem anseia por algo impreciso
o certo é que garimpava nos trastes
um enredo que se esvaia
fluía, diáfano, sutil
indo pelas frestas
congestas de poeira
levando para além
o que buscava sem saber o quê...
escarafunchei o baú
a cada investida,
trazia à tona trechos,
retalhos, fragmentos
momentos do ontem antigo
de tal sorte
a formar um mosaico
desconexo, desconforme,
incongruente, de antanhos fugidios
como peças que não se encaixam
em contraste com a pressa
de quem anseia por algo impreciso
o certo é que garimpava nos trastes
um enredo que se esvaia
fluía, diáfano, sutil
indo pelas frestas
congestas de poeira
levando para além
o que buscava sem saber o quê...
FOLHA EM BRANCO
na folha imaculada
mensagens e grifos
tudo se cogita
um testamento
posses e coisas
ou breve recado
desenho colorido
jardins em flores
ou última morada
hino de louvor
grito de protesto
um alento suicida
a revelação de uma dor
crime inconfesso
ou tímidez de um amor
lacônico gemido cifrado
angústias de enjeitado
um brado por socorro
jaz sobre a mesa
o papel ainda virgem
à espera de um enredo
final feliz ou inusitado
esperado ou estupefato
talvez um nada narrado ...
...o papel tudo aceita, viagens em alegorias, verdades e fantasias...
(06/08/2009)
* Selecionada para figurar na Antologia 100 Poetas Brasileiros Contemporâneos, edit CBJE, Rio de Janeiro, edição Julho/2010.
mensagens e grifos
tudo se cogita
um testamento
posses e coisas
ou breve recado
desenho colorido
jardins em flores
ou última morada
hino de louvor
grito de protesto
um alento suicida
a revelação de uma dor
crime inconfesso
ou tímidez de um amor
lacônico gemido cifrado
angústias de enjeitado
um brado por socorro
jaz sobre a mesa
o papel ainda virgem
à espera de um enredo
final feliz ou inusitado
esperado ou estupefato
talvez um nada narrado ...
...o papel tudo aceita, viagens em alegorias, verdades e fantasias...
(06/08/2009)
* Selecionada para figurar na Antologia 100 Poetas Brasileiros Contemporâneos, edit CBJE, Rio de Janeiro, edição Julho/2010.
FURTIVAS PERCEPÇÕES
sons trazendo emoções,
encontradas, relembradas,
guardadas no imo d´alma
num momento, repente,
alheia, ausente, despropositada,
eis que reacende, intensa
leva a mente, trai os olhos
nublados d´água,
dique extravasado, viagens
e outros cenários íntimos
se descortinam, avivam,
alheando olhares, distanciando...
*selecionada para figurar na 68° Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos, edit CBJE, Rio de Janeiro, edição Julho/2010.
encontradas, relembradas,
guardadas no imo d´alma
num momento, repente,
alheia, ausente, despropositada,
eis que reacende, intensa
leva a mente, trai os olhos
nublados d´água,
dique extravasado, viagens
e outros cenários íntimos
se descortinam, avivam,
alheando olhares, distanciando...
*selecionada para figurar na 68° Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos, edit CBJE, Rio de Janeiro, edição Julho/2010.
quinta-feira, 22 de julho de 2010
VIDAS EMPENHORADAS (CONTO)
Dos passos dados os mais longos foram no sentido da entrada ao balcão
Informado pelo atendente, deixou seu nome e sentou-se em uma poltrona, ao fundo da sala, onde também outros aguardavam a sua vez de serem atendidos.
Nas mãos trêmulas o estojo precioso, arquivo de recordações, de inestimável valor sentimental.Tinha uma decoração de simples ornado, apertava docemente a pequena caixa, como se a acariciasse, feito um parente que vai viajar e que, antecipadamente, já sentisse a ausência.
Revia-se enamorado trocando alianças naquele inolvidável dia em que os marcaram para sempre, ali estava o par de anéis esponsalícios ,retirado com cuidado do dedo da amada, pretextando recomendações médicas.Fitando o par de alianças rememorava como estavam felizes naquela data em que o mundo parecia feito exclusivamente para eles.
A mente viajava em espirais que o fazia reaver os passos que o guiaram até ali. Os olhos nublavam.
- É grave, doutor ?
- É sempre preocupante, mas se consegue tratamento.
Casado há exatos 50 anos, a companheira passou a manifestar sintomas, caroço no seio, tumor maligno, encarecia ser extirpado o quanto antes, ablação urgente.. A internação seria imediata, pelo sistema público de saúde, mas haveria outras despesas, as viagens da pequena cidade até a capital e a hospedagem,.
Olharam-se amuados e cúmplices, as mãos enrugadas apertadas como se pedindo socorro um ao outro. Tantas expressões nos olhares que sabiam se comunicar sem pronunciar palavras. A idéia de se separarem doía mais que a cirurgia inevitável. Ela ficara internada, ele viu-se só a ter que tomar as decisões.
Casal idoso, sem filhos. A velha casa, herança dos pais dele, era o teto que os acolhia e viviam como pássaros felizes naquele ninho. A aposentadoria de ambos, dois salários mínimos, dava para as despesas mais imediatas, jamais para aquela inusitada situação..
Na caixa acalentada nas mãos, trazia lembranças que se reportavam às histórias daquelas vidas, de suas mocidades, namoro e, por fim, o longevo casamento. Eram como os retratos na parede da sala, deles e dos antepassados. Cada conquista uma lembrança através de um mimo, um par de brincos, um anel, as alianças benzidas na capela pelo pároco, um pingente deixado no leito de morte pela saudosa mãe, ali estavam suas vidas, suas memórias. Havia o terço em pedrinhas semipreciosas com o crucifixo em ouro dezoito, um broche com pequenos estilhaços de rubi, e até um dente de ouro, que já tinha sido moda em outros tempos, preservado como relíquia.
Aguardava o atendimento, opresso pela inevitável separação. Nem supunha o valor que lhe pagariam por aquelas preciosidades de uma vida inteira, retalhos de épocas, tempos felizes... Mas se aquilo poderia significar a recuperação da saúde da companheira, então tudo faria sentido... vão se os anéis, ficam os dedos, esboçou um sorriso amarelo ao lembrar-se do ditado popular. Percebera que deixara de sorrir desde que o infausto os visitou. Sentiu um certo alívio com aquele gesto imprevisto, um riso, que jamais se permitiu desde então.
- Hildebrando Marques - anunciou o atendente.
- Sou eu, levantou-se vagarosamente, apertando entre as mãos o pequeno baú.
O homem, gentil mas econômico nas palavras,meio calvo, utilizando-se de uma lente grossa, fazia silêncio e olhava detidamente cada peça, segura por uma pinça, como se vasculhasse detalhes...
- São originais... falou em sussurro o vendedor ansioso, sentado em uma cadeira junto à mesa do avaliador. Parecia defender seus pertences da aparente desconfiança daquele estranho e quieto observador.
Com um aceno de cabeça, imerso em suas pesquisas, parecia concordar com a inusitada manifestação do velho.
- São originais sim, senhor, mas de pouco valor. Exceto o broche e as alianças, as demais peças não representam muito...
- Não ? Susteve a respiração como se estivesse ofendido...São nossas riquezas.
- Entendo, senhor, têm o seu valor sentimental. O que quis dizer é que não são metais nobres, de valor pecuniário relevantes, compreende ?
Um suor frio brotava da testa do ancião, um medo de que suas esperanças fossem infundadas.
- Isso quer dizer o quê, meu senhor ?
- Lamento, mas apenas o broche e o par de alianças possuem algum interesse para a penhora. O broche por estar intacto e ter um desenho raro, as alianças por serem de ouro 18, e também por estarem conservadas, apesar dos anos.
Acompanhou em silêncio a separação das peças colocadas cada qual em envelopes pardos, registrados com etiquetas manuscritas pelo avaliador.
Autômato a vagar até o guichê. Voltava com a pequena caixa, desprovida do broche e das alianças, com uma quantia, muito aquém do que necessitava.
Dos passos dados os mais resolutos e rápidos foram no sentido da saída.
Sua figura arcada deixou a loja e foi desaparecendo no meio da multidão...
Junto ao corpo, como acalentando um ente querido, protegendo-o, levava a sua caixinha preciosa, materializavam momentos únicos, ricos em lembranças, uma verdadeira fortuna pessoal, que importava aos demais ?
Era a maior riqueza para eles.
TEXTO SELECIONADO PARA FIGURAR NA ANTOLOGIA DE CONTOS IMITAÇÃO DA VIDA, EDITORA CBJE, RIO DE JANEIRO, EDIÇÃO JULHO/2010.
quarta-feira, 21 de julho de 2010
PASSOS RELEMBRADOS
vaguei por estas calçadas
ensimesmado, desatento
trazia nos sonhos, alentos,
saturados na juventude
e na mente esquadrinhava
textos, pensamentos,
vidas às personagens irreais
arrimos nas solitárias rotinas
a viver dias maçantes
a quem, não alado,
só sonhava voar...
NUANCES EXISTENCIAIS
pêndulo oscilante
frenesi apatia,
sanidade insana,
tristezas euforias
tênues véus
a louvação
ode à vida
e amarguras
céu precipício
tão próximos
luzes trevas
paraíso abismo...
frenesi apatia,
sanidade insana,
tristezas euforias
tênues véus
a louvação
ode à vida
e amarguras
céu precipício
tão próximos
luzes trevas
paraíso abismo...
sexta-feira, 16 de julho de 2010
VIVÊNCIAS
sua face um mapa
traçando caminhos
lembrando histórias
seus cabelos alvos
dispersos, desatentos
soltos no vento
nas rugas os olhos
intensos, atrevidos,
ricos de descobertas
a pujança viril
distante
de quem dela se fartou
nos deleites da mocidade
a intepridez indômita
seus ganhos e perdas
tudo assentia, mudo,
sereno, reflexivo,
sábio de vida vivida
sem admoestações
recriminações
conselhos
cada qual aprendiz
nas caminhadas próprias
sonhos e desenganos...
traçando caminhos
lembrando histórias
seus cabelos alvos
dispersos, desatentos
soltos no vento
nas rugas os olhos
intensos, atrevidos,
ricos de descobertas
a pujança viril
distante
de quem dela se fartou
nos deleites da mocidade
a intepridez indômita
seus ganhos e perdas
tudo assentia, mudo,
sereno, reflexivo,
sábio de vida vivida
sem admoestações
recriminações
conselhos
cada qual aprendiz
nas caminhadas próprias
sonhos e desenganos...
quarta-feira, 14 de julho de 2010
O SOL NA JANELA
debalde os raios intensos
esmaecem já seus ardores
tisnado em nuvens densas
na opulência de seu reinado
cinzas ficam seus véus áureos
encolhe-se na timidez
e, pusilânime, reflete
caindo, vencido, exangue
a majestade em seu ocaso
divide o horizonte
com o tempo hostil
bátegas d'água não tardam
recolhe seu esplendor
volta ao seu silêncio
triste dia sem calor...
esmaecem já seus ardores
tisnado em nuvens densas
na opulência de seu reinado
cinzas ficam seus véus áureos
encolhe-se na timidez
e, pusilânime, reflete
caindo, vencido, exangue
a majestade em seu ocaso
divide o horizonte
com o tempo hostil
bátegas d'água não tardam
recolhe seu esplendor
volta ao seu silêncio
triste dia sem calor...
segunda-feira, 12 de julho de 2010
CRIADOR / CRIATURA
com afinco esmerado
esculpia a autoimagem
na visão de si se detinha
pintado de majestoso
nele se mirava
a si admirando
do cascalho
a pedra bruta
luzia aos poucos
beleza e perfeição
de um ente ideal
estranho se lhe ficava
ele com suas feridas,
contraste da arte esculpida,
o imperfeito mortal ...
esculpia a autoimagem
na visão de si se detinha
pintado de majestoso
nele se mirava
a si admirando
do cascalho
a pedra bruta
luzia aos poucos
beleza e perfeição
de um ente ideal
estranho se lhe ficava
ele com suas feridas,
contraste da arte esculpida,
o imperfeito mortal ...
terça-feira, 6 de julho de 2010
ABSTENÇÃO
que se me faça
os acontecidos
me distancio,
nas correntezas
das asperezas
me policio
não remo contra
nem mãos em pregos
solto minhas rédeas
se dizem sim
não é ruim
melhor assim
não desconverso
nem tergiverso
refugio em mim...
os acontecidos
me distancio,
nas correntezas
das asperezas
me policio
não remo contra
nem mãos em pregos
solto minhas rédeas
se dizem sim
não é ruim
melhor assim
não desconverso
nem tergiverso
refugio em mim...
A DISSERTAÇÃO E A POESIA
calei-me, condoído,
nada fazia sentido,
sentir era o de menos
apura-se a razão,
só a ela reverências
o mais, fraquezas
olhares enviezados
ausências momentâneas
considerações estranhas
furtivas percepções
narrativas em versos
discursos patéticos
na dissertação
era o real nu e cru
o mais, incômodos...
nada fazia sentido,
sentir era o de menos
apura-se a razão,
só a ela reverências
o mais, fraquezas
olhares enviezados
ausências momentâneas
considerações estranhas
furtivas percepções
narrativas em versos
discursos patéticos
na dissertação
era o real nu e cru
o mais, incômodos...
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