terça-feira, 30 de novembro de 2010

A ARTE NO VIVER

halos das inspirações
suores,  respiração
atos corriqueiros

assim, o jardineiro
na poda das flores,
a costureira a coser

o pedreiro e sua parede
a visão do arquiteto
a decoração aprumada

a criança e seu brinquedo
arrebóis no horizonte
o poeta e suas letras

a vida escola,
sofrida, curtida,
desafios e encantos...

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

ILUSÓRIAS VITÓRIAS

ouçamos os lamentos
de todas as civilizações
no enrodilhar das trajetórias

pedras sobre pedras
castelos desmoronados
fraticidas lutas pelo poder

efêmero como os ventos
mutantes em cada estação
poeiras dos tempos

títulos e honrarias
esqueletos e cinzas
estandartes em sangue

marcha penosa, medalhas,
renitentes penitentes
fátuos brilhos, pseudo vitórias...

APELO PAGÃO

Mãe, te endereço,
do filho  descrente,
um apelo, um sinal.

de suas vibrações de paz
no olhar abnegado
eflúvios amenizantes

ao fogo intenso
no íntimo penar
em que se bate

rogai, ó querida,
por este renitente,
a sofrer,

ingrato,
infiel,
que a ignora...


*Selecionada para figurar na antologia VERSOS PARA MARIA, editora CBJE, Rio de Janeiro/RJ, julho/2011

ANJO OU DEMÔNIO

quem, do centro do tablado,
tênue iluminado,
deserto de alegorias, surreal;

faz-nos alçar em inusitados estados
pássaros desacostumados de voar
coniventes,acomodados, aparlermados

 franzina figura de evocação divina,
voz afinada e gestos intensos,
fazendo do pobre cenário, imenso;

desafios inquietantes inoportunos,
da poltrona à ousadia de pensar
provocando choros, gemidos, suores;

que Ser é este, magnânimo
ou satânico, em vestes divinais,
ressuscitando os mortos

das idéias fossilizadas
verdades consolidadas
para o sonho além, libertário ?...

IMORTALIDADE

voltaremos em contextos,
vindo inusitados,
ocasionais, despropositados

figurantes em  momentos,
numa conversa fiada,
num repente, acaso,

eis-nos, novamente em cena,
furtivos instantes,
revividos em lembranças 

de contemporâneos retardatários
estaremos ressuscitados
como personagens passados...

DOR & AMOR

rastros na caminhada
louvores em mel
feridas em fel

passos certos
incertos rumos
rotas imprecisas

pegadas lembradas
mágoas esquecidas
dores relevadas

vida vivida
curtida
sofrida

lições na dor
aprendizados
ensinos de amor...

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

ESTRANHO CONHECIDO ( CONTO)


A decisão de ali estar foi conflitante, luta íntima, inglória, um reclamo mudo, angustiante, de socorro, sem ,contudo, saber o que o esperava. Foram noites insones, avaliações da vida, sentimentos martirizados em reflexões. Um verdadeiro balanço de seus atos, um reencontro consigo mesmo, um reatar amargo com um passado que julgava superado.

Nos idos tempos, rompera com a placidez insossa de seus dias, renegando a apatia de seu cotidiano, dera uma guinada, um recomeço de rota, viagem sem espaços ao que deixava, em busca de um destino ignorado em novos caminhos. Atrás de si relembrava uma história mal vivida, angustiante, e deu asas a si próprio e ousou caminhar em novas estradas...

Mas, ali estava frente àquela casa que um dia habitou, a qual abandonou sem maiores despedidas, em uma incógnita retirada. Cansara-se de si mesmo naquelas rotinas, os papéis que a vida se lhe apresentara, uma casa para cuidar, mulher e crianças.Sentiu-se asfixiado naquele panorama, como se estivesse morto embora respirasse, refletisse, necessitava de ar puro, outros ares, novas tentativas de seguir andando, naquela situação, definitivamente, não se encontrava. Fora vencido pelo tédio do ir e vir ao modorrento trabalho e voltar para o lar em dias sucessivos e intermináveis. Lida insuportável, maçante. Rompera com isso há anos, evadira-se como um libertino, irresponsável, desatara por si mesmo os laços que o prendiam àquelas penosas obrigações, sem relevar seus compromissos assumidos com o enredo de outras vidas, esposa e filhos.
O que poderiam ter pensado de seus desatinos ? Enlouquecera, talvez, mas aonde andaria, teriam- no procurado ? Nunca soube, partira sem deixar vestígios, bilhetes, telefonemas, nada, assim fizera com a repartição em que trabalhava, simplesmente tomara outro rumo, em busca da ignota e sedutora liberdade. Na verdade procurou apagar seus próprios rastros, não se dando a pensamentos e preocupações que julgava inúteis.

Vagara por outros mundos, assumira outras funções, apenas o nome, por impossível de se mudar, continuou o mesmo.

Andara a esmo, curtindo cada aventura, sabores e dissabores de sua escolha. Mas voltava ao ponto de partida, uma bagagem apenas, uma roupa surrada, as cãs dos cabelos revelando tempos áridos e distantes, face sulcada, vitalidades pretéritas já no ocaso da existência. Um pigarrear incômodo, baços olhos a vislumbrar fronteiriço o lar , teto esquecido.

Lembrar-se-iam dele ? O casal de filhos já estavam adultos, seria a esposa ainda viva? Pensamentos a distraírem-no ante aquela casa, poucos metros o distanciavam até a porta da entrada, temores de tocar a campainha, talvez fosse melhor retornar sob os próprios passos, assumir a sua opção de ser só e independente... Fora-se ainda jovem, resoluto, por que retornar, velho, alquebrado, ao ponto inicial?

Quem levantar-se-ia para advogar suas razões existenciais, rarefeitas de responsabilidades ? Apresentava-se com uma mala, poucas roupas, uma personagem trânsfugas, não o herói que foi à luta e retorna da guerra glorioso de seus feitos, mas o pássaro que alçou alturas, desdenhou o ninho e agora implora calor,abrigo, aconchego.

Chegar até ali havia sido um avanço, ir até a porta, todavia, parecia impossível, as pernas fincadas como cimento no solo, não conseguia se mover , já não tinha as mesmas certezas de outrora, onde, resoluto, debandara. Tinha ciência de sua posição egoísta. Tivera sobre si os cuidados de uma família e não o incomodou o fardo transferido aos ombros únicos da companheira que esposara.

Sentia-se retraído, os próprios pensamentos o martelavam, a consciência o acusava de sua fuga, de sua leviana opção, talvez não resistisse às inevitáveis acusações, legítimas, guardadas em mágoas pelos entes abandonados à própria sorte, sem sequer saberem de seu paradeiro errante. Como devem ter sentido a falta de um pai à mesa, em seus momentos de inseguranças, próprios da infância e da adolescência, onde a figura paterna é um arrimo, um consolo, conjecturava amargo e culpado.


E o que dizer das necessidades experimentadas pela companheira, de repente sozinha a responder pelos deveres e compromissos de uma casa ? E aonde andava ele nesses tempos ? Voando ao léu, sem porto certo, à deriva de si mesmo. Um frio suor porejava nas têmporas, aquilo era demais para ser enfrentado, não se sentia capaz desse encontro íntimo com sua história .Mas permanecia imóvel, atado feito estátua naquele ponto fixo, frente à antiga morada, como em um tribunal sendo julgado por si mesmo.

Absorto em suas reflexões, estatelado onde estava, viu a porta abrir-se, um casal de meia idade, sorridentes, saírem abraçados, em atitudes de companheirismo e amor. Duas belas crianças despediam-se dos velhos, possivelmente os netos, em gracejos e folguedos.

Ao passarem por ele, os olhos dela, curiosos, cruzaram-se com os dele, fitaram-se; sentiu que fora reconhecido, mas ela permaneceu muda, como se questionando de onde o conhecia...instantes breves, ou longos demais, um aceno de despedidas ou a constatação de uma verdade, o casal afastou-se, tendo ela, voltando-se, num átimo, para fitá-lo mais uma vez...

Acabrunhado, encurvado sobre si mesmo, fazia o caminho de volta, rumo ao desconhecido, na esteira da aventura que o seduzira.

Retirava-se aliviado por evitar o confronto com os seus. Melhor a morte inevitável como desconhecido a expor-se diante às vítimas de suas escolhas, na caridade inoportuna e imerecida, a ser reivindicada apenas pelos laços de sangue, distantes do afeto não semeado.

Naquele ninho, outrora abandonado, existia outro pássaro ocupando o lugar negligenciado, e, por certo, assumira seus deveres e colhia o reconhecimento de seus entes familiares.

Quanto a ele, apenas uma sombra, um detalhe do passado...


*Selecionado para figurar na Antologia de Contos Criadores & Criaturas, edit. CBJE, Rio de Janeiro/RJ, edição Janeiro/2011.

VIDAS ENCENADAS

  singulares átimos
encantados momentos
  frenéticas pulsações
  um corpo em outro
 simbiose catártica
enaltecem as jugulares
  umedecem as pupilas
deblaterando no palco
    gestos dramáticos
congestos, incendidos
    figura encarnada
vivendo a personagem
semeando emoções, reflexões, 
   colhendo aplausos...

domingo, 21 de novembro de 2010

VESPERTINAS ROTINAS

entre as rotinas
manhãs apressadas
e a hora vespertina

exaurida calorenta
ou cinza  pálida
na ausência do sol

modorras da digestão
demarcando horários
meio dia já finalizado

nas tardes intensas
pulsações frenéticas
do período derradeiro

abelhas irriquietas
humanas colméias
tarefas consumidas

prelúdio da noite
movimentos
ida da vinda...

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

IMÓVEIS VIAGENS

decodificando códigos
verbais sentidos
aleatórios, imaginosos

pedra a pedra
letra a letra
castelos de sonhos

descrevendo o real
no irreal das coisas
alegorias, fantasias

às avessas da ótica
enfoques inusitados
estátuas e símbolos

plasmando a tela
cultivando sensações
apreendendo emoções

presente distante
andarilho sem estradas
astronauta em terra firme...

sábado, 13 de novembro de 2010

CRIADORES DE ILUSÕES

notas evoladas do instrumento
soprando as canções no tempo
emoções, sentimentos

na pedra bruta
garimpando detalhes
figuras esculpidas



tons em pinceladas
melodias expressas
em telas oníricas

colhendo flores
nos jardins da alma
compondo versos

saudando a vida
realçando  belezas
eternizando a existência...

*Selecionada para figurar na 73° Antologia de Poetas Brasileiros Contemporâneos, edição Janeiro/2011

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

SUTIL VISITA

nasce sorrateira, sem causa,
franzir de testa involuntário,
um gesto vago, solitário

umedece os olhos
arrepia a pele
em torvelinhos a mente

e de repente, inusitada,
me faz distante, calado,
concatenando sentidos

retratando emoções
sem retê-las nas nuances
desafio a decifrar em versos

como brisas efêmeras
chuviscos de primavera
momentos em desfile

inconstante, imprevista,
vai em rodopios, bailando,
instigante musa passageira...

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

MUNDOS PARALELOS

aves de arribação
migrando em voos
em outras estações

buscando alimentos
do frio ou do calor
voando em bandos

humanos seres
mesmas calçadas
diversas direções

sobrevoando espaços
universos diversos
juntos e distintos

mesma rota
díspares caminhos
paralelos destinos...

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

E T E R N I D A D E









sem cenários específicos
 estradas, pontes,
mesa, papéis, horizontes


nada há de especial
apenas os devaneios
retratados em gestos


diante a tela
pincéis e tintas
um homem delira


na pedra bruta
rasga, lapida,
cria uma figura


nos instrumentos
debruçado, viaja
arranja sons, se deleita


na folha alva
em respingos
alça voos, imagina


tudo fica
na essência
buscas da permanência


na breve
fugidia
existência...





POESIA SELECIONADA PARA FIGURAR NA 62° ANTOLOGIA DE POETAS BRASILEIROS CONTEMPORÂNEOS, DA CÂMARA BRASILEIRA DE NOVOS ESCRITORES, EDIT. CBJE.

* POESIA ESCOLHIDA PARA FIGURAR NA ANTOLOGIA AS MELHORES POESIAS DE 2010, EDIT CBJE.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

IGUAIS NAS DIFERENÇAS

nuances apreendidas
paisagens, imagens
decodificadas emoções

externas manifestações
libertos sentimentos
particulares ecos

esponja aberta
derme exposta
registros na mente

distintas sensações
em mesmos motivos
idiossincrasias próprias

difere os seres
iguais semelhantes
no íntimo de cada um...